quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Necromantic

«Waltz to a scream»... «undressed to the bone»... «mend my tattered body»... «an annoying hitch in the back of my eye»... «Necromantic» é, provavelmente, a música mais sombria que temos. O ambiente é próximo de um pesadelo asfixiante, numa cadência quase gótica – aliás, a primeira impressão que tivemos quando começámos a trabalhar nela foi a de uma estranha proximidade com temas de Bauhaus – algo inesperado para todos, mas que tornou ainda mais interessante o desenvolvimento da mesma.

Uma música de extremos pede uma prestação de extremos: por esse motivo, raramente chego ao final da música com voz; por essa razão, também, o falsete do Emídio atinge tonalidades bem altas; as guitarras feitas pelo Pedro ganham contornos arrepiantes e os ritmos do Bruno – que é um mocinho tão certinho – entram numa estranha e desarrumada cadência...

Um amigo nosso brinca connosco, frequentemente, sobre o facto de esta música parecer a Carmina Burana. Em dramatismo, pelo menos, julgo que está próximo da verdade...

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Low bat love

O «Low bat love» costuma ser a música com que iniciamos os concertos. A letra foi feita por todos em intenso brainstorming e aborda, em linha simples, a tentativa de um indivíduo em construir a mulher perfeita. Posta nestes termos, a proposta parece amena e prazenteira (quase que nos evoca aquele filme clássico dos anos 80, Weird Science); porém, na música em questão, a coisa descamba num dos temas mais incomodamente fortes que fizemos, só encontrando um rival à altura, porventura, na música «Necromantic» (que também gravámos e que será o último tema deste conjunto de textos).

Curiosamente, neste e noutros âmbitos (também a letra do «Necromantic» foi feita em conjunto, por exemplo), as duas músicas parecem ser, de algum modo, afins. Como o Pedro costuma dizer nos concertos, na apresentação das mesmas: Se o «Necromantic» é, tipicamente, sobre um pesadelo, esta [«Low bat love»] é uma sobre um sonho que correu mal.

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Inland Crusing

«Em Inland Crusing», narra-se o mundo pelos olhos de alguém que se encontra química e emocionalmente alterado. A imagem que melhor o define encontra-se num dos muitos momentos alucinantes do Fear and Loathing in Las Vegas, do Terry Gilliam: as caras distorcidas, os olhares estranhos, a lentidão das pessoas à nossa volta... a progressão da música acompanha esta ideia: o ambiente semi-dançável do início antecipa uma explosão sonora radiante e, ao mesmo tempo, incómoda: como um dançarino que, a meio de um passo difícil, tropeça no próprio pé; porém, na atrapalhação, acaba por terminar o acto, impávido (mas pouco sereno).

É fácil justificarmos uma suposta distorção da realidade pelo uso de estupefacientes (ou, no caso particular deste tema, álcool – muito álcool...). Menos fácil é aceitar que esta estranheza nos mostre quão cru e estranho é o mundo, por vezes. Ou como diz a canção: «A mean machine [that] spreads feathers breathing red»....

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

I'll crush your ego

O «I’ll crush your ego» é uma das músicas mais desconcertantes que temos. Este foi o tema que demorou mais tempo a ser concluído – normalmente, nunca estamos de acordo à primeira, mas neste caso, a coisa arrastou-se, julgo, por alguns meses. Talvez isso justifique o ambiente um tanto ou quanto neurótico da canção: a estrutura pouco linear, o uso de diferentes instrumentos (as percussões da parte final, que foram gravadas por nós os quatro, por exemplo), a mudança de vocalista principal de uma parte para a outra... sem grandes surpresas, a letra trata disso mesmo: em termos genéricos, é sobre uma discussão; em termos específicos, sobre a discussão que se gerou em torno desta música. Como se refere no final: por vezes, somos uma espécie de potros em fogo [«fire foals»] - teimosos, a espernear, sempre a querermos levar a nossa opinião avante...

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

5 children

A música «5 children» é, sem grandes rodeios, sobre nós. Ou fazendo melhor as contas: sobre nós e o Luís, o nosso actual técnico de som e membro integrante da banda na altura em que a canção começou a ser delineada. Não consigo explicar muito bem como é que tal noção se relaciona com expressões como «We confide in cats with scars» ou «Rectify the red light» (dois dos versos que compõem a letra), mas o que é facto é que elas fazem sentido na definição dos Deep Coffee Nonsense – pelo menos, a esta hora tardia em que escrevo...

«5 children» é, por esta ordem de ideias, uma das coisas mais onanistas que fizemos. É verdade que parte dos temas que gravámos não apresentam qualquer cunho autobiográfico (aparente, pelo menos...), como o «Low bat love» ou o «Necromantic»; porém, noutros casos, a nossa experiência de banda (vide «I’ll crush your ego») ou qualquer outro episódio biográfico estranho (vide «Inland Cruising») parecem constituir o mote... Aguentar mais de 15 anos a tocar praticamente com as mesmas pessoas tem destas coisas: ficamos um bocadinho lamechas...

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Glance Moves

Há sempre algo que muda de banda para banda, de álbum para álbum, de EP para EP. Connosco, as coisas não são muito diferentes – conhecemo-nos há uns 16 ou 17 anos e cada vez concordamos menos com esta ou aquela opção. Unanimidade é coisa que nunca conseguimos à primeira, o que, do ponto de vista criativo, nem é mau...

Existe, porém, um processo que nunca se alterou nesta nossa (já) longa convivência musical: o modo como escolhemos o nome para um álbum/EP. Invariavelmente, fazemos sempre a mesma coisa: retiramos uma palavra ou expressão de uma das nossas letras e esperamos que a coisa adquira, com o tempo, um sentido.

«Glance Moves» foi uma dessas expressões. Curiosamente, devido às mudanças que fizemos na vocalização durante a gravação do tema, a mesma já nem existe na sua fonte original («Inland Crusing»); o nome acabou, ainda assim, por ficar.

Na música, a expressão «glance moves» é (ou era...) utilizada como um trocadilho de «dance moves»; cada uma delas aparecendo numa estrofe diferente. A deambulação entre uma e outra relaciona-se, creio, um pouco com os relances que algumas pessoas fazem ao dançar (nunca estiveram num bar às 6 da manhã e trocaram o olhar com alguém que dança incessantemente numa pista de dança; nesse instante, o som parece abafar-se por dois segundos e as coisas passam para slow-motion; depois essa pessoa desvia novamente o olhar e o tempo volta ao seu curso natural? É qualquer coisa do género...).

O que tem esta ideia a ver com as 5 canções escolhidas e, particularmente, com os Deep Coffee Nonsense? Pessoalmente, vejo cada uma das músicas como uma espécie de vislumbre sobre uma ideia ou questão em particular; um olhar que marca mais uma impressão e menos uma certeza. Em nenhuma das músicas conseguimos chegar a uma conclusão definitiva – como andar de comboio sem perceber muito bem em que estação parar. Ou, se quisermos voltar à metáfora do bar: como o rapaz que voltou para casa sozinho, sem a rapariga nos braços, mas com a imagem do seu olhar bem guardada na memória.